sexta-feira, 2 de março de 2012

Tão forte e tão perto (Extremely Loud and Incredibly Close, 2011)




Stephen Daldry é um diretor com uma rica sensibilidade e isso é visível ao ver os filmes da sua carreira, mas ele possui uma característica singular que marca alguns filmes do seu currículo, ele sabe como ninguém falar do universo infantil. Ele começou fazendo isso em Billy Elliot, continuou em As Horas (conseguindo extrair uma linda interpretação do garotinho Jack Rovello, filho de Laura Brown), depois de um hiato em O leitor, ele volta a falar disso no seu mais novo projeto Tão forte e tão perto. Então, é fato que Daldry tem um nível de excelência em seus trabalhos como poucos diretores hoje em dia, é fato também que é um excelente diretor de atores, já que de cada filme seu sempre tem um vencedor ou indicado ao Oscar, seu nome virou sinônimo de qualidade.

Na estreia de seu mais novo filme, Tão forte e Tão perto, a crítica americana apontou seus defeitos e o lançou no mar do esquecimento (mas mesmo assim ele viu seu filme indicado ao Oscar de Melhor Filme e Melhor Ator Coadjuvante). O fato é que Tão forte e Tão perto está longe de ser o fracasso, a decepção que alguns clamam, mas também está longe do nível de excelência que Daldry costuma alcançar. Pelo fato de ser um diretor com uma visível competência, quando as pessoas veem seu nome em algum projeto, todos já esperam algo no mínimo digno de ser chamado de “obra-prima”, mas isso não acontece aqui, por isso tamanho questionamento.

Tão forte e tão perto, conta a história de um garotinho que vê seu pai que também é seu melhor amigo morrer no trágico dia 11 de Setembro, no atentado as Torres Gêmeas, a partir disso ele vai mergulhar em uma busca incessante atrás do enigma que seu pai deixou a ele, encontrar a porta que abre com a enigmática chave deixada no guarda-roupa. O roteiro é baseado no livro de Jonathan Safran Foer que é cheio de voltas e revoltas, passa por diversas situações, ora divertidas, ora dramáticas, portanto Eric Roth merece aplausos por ousar mexer em algo que adaptado para o cinema pode soar como um amontoado de clichês, não que  filme não escape disso, mas sei medianamente bem. Roth é o cara que escreveu Forrest Gump  - O Contador de Histórias e O Curioso Caso de Benjamin Button, então ele tem bastante experiência nisso.

Durante todo o filme percebemos que Oskar Schell, interpretado por Thomas Horn, tem uma mente peculiar, aliás, fica bastante implícito ao longo da projeção se ele realmente sofre de algum transtorno psíquico, só há um momento onde esse assunto é tocado, na cena em que ele conversa com a personagem de Viola Davis e afirma que uma vez fez um exame para Síndrome de Asperger, e mesmo que ele tenha algumas características, como a incapacidade de relação social (para isso seu pai o instigava através de buscas por coisas pela cidade que assim o obrigava a conhecer pessoas), ou a inabilidade de consolar os outros já que parece distribuir beijos e abraços para as pessoas aleatoriamente de forma distante e fria, sempre alienado do significado emocional que isso pode ter e até mesmo a identificação com números e lógica (já que para conseguir encontrar o dono da chave elaborou um esquema próprio, IZD, Índice de Zonas Dobráveis, que parece difícil para qualquer mente comum), nada é comprovado de fato, são apenas conclusões que se pode tirar.

O trabalho do garotinho Thomas Horn não é dos mais fáceis, aqui ele tem uma figura complexa, que se encontra em estado de luto e que tenta lidar com isso da forma como sua cabeça pede, seus conflitos emocionais estão sempre latejantes e nas cenas mais dramáticas, ele não decepciona, ao lado de Sandra Bullock e Max Von Sidow. Às vezes, o jovem Oskar pode soar mimado e chato, mas acredito que Thomas conseguiu lidar com isso de maneira formidável. Max Von Sidow surge como uma melancólica figura muda, sem pronunciar uma palavra o ator sueco oferece uma intepretação comovente, Viola Davis aparece como uma mulher chorosa e sofrida como sempre, mas é competente como sabe ser, e até Jeffrey Wright (da minissérie Angels in America) tem seu momento marcante, mesmo que minúsculo. Já Sandra Bullock faz o que pode com sua personagem unidimensional que surge pronta para chorar a cada cena em que aparece mesmo que não seja necessário, e Tom Hanks, aparece como uma figura única caricata.

Recentemente vi um filme francês chamado Brinquedo Proibido, que conta a aventura de duas crianças que se fascinam por cruzes e passam a roubar todas que veem, depois da morte dos pais de uma delas durante a Segunda Guerra Mundial, pude traçar um paralelo com Tão forte e Tão perto, já que parece que nos dois filmes as crianças passam a lidar de forma quase obsessiva por determinadas coisas depois da morte de alguém que amam, no processo do luto, as crianças parecem sempre focarem suas atenções em outras coisas para não ter que lidar com a dor da perda.

O fato é que esse parece ser o filme mais comercial de Daldry (Bullock e Hanks em um mesmo projeto, mesmo que para papéis coadjuvantes é sinônimo de boa bilheteria), e também o mais questionável, mas espero que Daldry consiga recuperar toda sua sensibilidade e inteligência e consiga fazer novamente um filme de tamanha excelência como As Horas.

5 comentários:

Alessandro disse...

Bom texto, é sempre bom ler do ponto de vista de quem leu a obra, mas sou um dos q não gostou do filme e já comentamos no Facebook.

Um dia farei um texto sobre diretores que, após realizarem sua obra-prima, criam uma grande expectativa no público e principalmente nos fãs e não conseguem suprir e produzir algo tão bom...Daldry no caso de "As Horas" e Malick c/ "Além da Linha Vermelha" só pra citar alguns.

Kauan Amora disse...

Dificilmente eles se superam

Elton Telles disse...

Dae Kauan!
passando aqui para conhecer o seu espaço.

Olha, não fui o mais entusiasta com "Tão Forte e Tão Perto", não.

Aliás, acho que Daldry escorrega e bate a cabeça nesse filme, que é frágil narrativamente, totalmente inverossímil e apela para as ceninhas mais manjadas e soluções bobas para fazer o espectador se sentir tocado. Mas a manipulação da emoção é muito visível e pontual na narrativa do filme. Odiei o protagonista, quis esfregar a cara desse moleque no asfalto e jogar álcool rs. Os demais atores do elenco são desperdiçados, creio eu. Não apenas porque é assinado por esse diretor, mas achei o filme realmente bem decepcionante, e péssimo para os padrões Daldry de qualidade.

abs!

Elton Telles disse...

Ah, e Kauan, disponibilize no seu blog a opção Nome/URL nos comentários, porque nem todos tem conta no Google. Eu tenho, mas geralmente assino com o link do meu blog, que é http://www.gazetamaringa.com.br/blog/pospremiere/

abs!

Kauan Amora disse...

Tom, obrigado pela visita.
Bom, acho que eu fui o único que não sentiu ódio pelo garotinho. aushuahuahuahua
Mas, realmente, para quem um dia dirigiu As Horas, Tão forte e Tão perto realmente é escorregar um pouco, mas não achei um completo desastre.

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