Stephen Daldry é um diretor com uma rica
sensibilidade e isso é visível ao ver os filmes da sua carreira, mas ele possui
uma característica singular que marca alguns filmes do seu currículo, ele sabe
como ninguém falar do universo infantil. Ele começou fazendo isso em Billy
Elliot, continuou em As Horas (conseguindo extrair uma linda interpretação do
garotinho Jack Rovello, filho de Laura Brown), depois de um hiato em O leitor,
ele volta a falar disso no seu mais novo projeto Tão forte e tão perto. Então,
é fato que Daldry tem um nível de excelência em seus trabalhos como poucos
diretores hoje em dia, é fato também que é um excelente diretor de atores, já
que de cada filme seu sempre tem um vencedor ou indicado ao Oscar, seu nome
virou sinônimo de qualidade.
Na estreia de seu mais novo filme, Tão
forte e Tão perto, a crítica americana apontou seus defeitos e o lançou no mar
do esquecimento (mas mesmo assim ele viu seu filme indicado ao Oscar de Melhor
Filme e Melhor Ator Coadjuvante). O fato é que Tão forte e Tão perto está longe
de ser o fracasso, a decepção que alguns clamam, mas também está longe do nível
de excelência que Daldry costuma alcançar. Pelo fato de ser um diretor com uma
visível competência, quando as pessoas veem seu nome em algum projeto, todos já
esperam algo no mínimo digno de ser chamado de “obra-prima”, mas isso não
acontece aqui, por isso tamanho questionamento.
Tão forte e tão perto, conta a história de
um garotinho que vê seu pai que também é seu melhor amigo morrer no trágico dia
11 de Setembro, no atentado as Torres Gêmeas, a partir disso ele vai mergulhar
em uma busca incessante atrás do enigma que seu pai deixou a ele, encontrar a
porta que abre com a enigmática chave deixada no guarda-roupa. O roteiro é
baseado no livro de Jonathan Safran Foer que é cheio de voltas e revoltas, passa
por diversas situações, ora divertidas, ora dramáticas, portanto Eric Roth
merece aplausos por ousar mexer em algo que adaptado para o cinema pode soar
como um amontoado de clichês, não que filme não escape disso, mas sei
medianamente bem. Roth é o cara que escreveu Forrest Gump - O Contador de
Histórias e O Curioso Caso de Benjamin Button, então ele tem bastante
experiência nisso.
Durante todo o filme percebemos que Oskar
Schell, interpretado por Thomas Horn, tem uma mente peculiar, aliás, fica
bastante implícito ao longo da projeção se ele realmente sofre de algum
transtorno psíquico, só há um momento onde esse assunto é tocado, na cena em
que ele conversa com a personagem de Viola Davis e afirma que uma vez fez um
exame para Síndrome de Asperger, e mesmo que ele tenha algumas características,
como a incapacidade de relação social (para isso seu pai o instigava através de
buscas por coisas pela cidade que assim o obrigava a conhecer pessoas), ou a
inabilidade de consolar os outros já que parece distribuir beijos e abraços
para as pessoas aleatoriamente de forma distante e fria, sempre alienado do
significado emocional que isso pode ter e até mesmo a identificação com números
e lógica (já que para conseguir encontrar o dono da chave elaborou um esquema
próprio, IZD, Índice de Zonas Dobráveis, que parece difícil para qualquer mente
comum), nada é comprovado de fato, são apenas conclusões que se pode tirar.
O trabalho do garotinho Thomas Horn não é
dos mais fáceis, aqui ele tem uma figura complexa, que se encontra em estado de
luto e que tenta lidar com isso da forma como sua cabeça pede, seus conflitos
emocionais estão sempre latejantes e nas cenas mais dramáticas, ele não
decepciona, ao lado de Sandra Bullock e Max Von Sidow. Às vezes, o jovem Oskar
pode soar mimado e chato, mas acredito que Thomas conseguiu lidar com isso de
maneira formidável. Max Von Sidow surge como uma melancólica figura muda, sem
pronunciar uma palavra o ator sueco oferece uma intepretação comovente, Viola
Davis aparece como uma mulher chorosa e sofrida como sempre, mas é competente
como sabe ser, e até Jeffrey Wright (da minissérie Angels in America) tem seu
momento marcante, mesmo que minúsculo. Já Sandra Bullock faz o que pode com sua
personagem unidimensional que surge pronta para chorar a cada cena em que
aparece mesmo que não seja necessário, e Tom Hanks, aparece como uma figura
única caricata.
Recentemente vi um filme
francês chamado Brinquedo Proibido, que conta a aventura de duas crianças que
se fascinam por cruzes e passam a roubar todas que veem, depois da morte dos
pais de uma delas durante a Segunda Guerra Mundial, pude traçar um paralelo com
Tão forte e Tão perto, já que parece que nos dois filmes as crianças passam a
lidar de forma quase obsessiva por determinadas coisas depois da morte de
alguém que amam, no processo do luto, as crianças parecem sempre focarem suas
atenções em outras coisas para não ter que lidar com a dor da perda.
O fato é que esse parece ser o filme mais
comercial de Daldry (Bullock e Hanks em um mesmo projeto, mesmo que para papéis
coadjuvantes é sinônimo de boa bilheteria), e também o mais questionável, mas
espero que Daldry consiga recuperar toda sua sensibilidade e inteligência e
consiga fazer novamente um filme de tamanha excelência como As Horas.
5 comentários:
Bom texto, é sempre bom ler do ponto de vista de quem leu a obra, mas sou um dos q não gostou do filme e já comentamos no Facebook.
Um dia farei um texto sobre diretores que, após realizarem sua obra-prima, criam uma grande expectativa no público e principalmente nos fãs e não conseguem suprir e produzir algo tão bom...Daldry no caso de "As Horas" e Malick c/ "Além da Linha Vermelha" só pra citar alguns.
Dificilmente eles se superam
Dae Kauan!
passando aqui para conhecer o seu espaço.
Olha, não fui o mais entusiasta com "Tão Forte e Tão Perto", não.
Aliás, acho que Daldry escorrega e bate a cabeça nesse filme, que é frágil narrativamente, totalmente inverossímil e apela para as ceninhas mais manjadas e soluções bobas para fazer o espectador se sentir tocado. Mas a manipulação da emoção é muito visível e pontual na narrativa do filme. Odiei o protagonista, quis esfregar a cara desse moleque no asfalto e jogar álcool rs. Os demais atores do elenco são desperdiçados, creio eu. Não apenas porque é assinado por esse diretor, mas achei o filme realmente bem decepcionante, e péssimo para os padrões Daldry de qualidade.
abs!
Ah, e Kauan, disponibilize no seu blog a opção Nome/URL nos comentários, porque nem todos tem conta no Google. Eu tenho, mas geralmente assino com o link do meu blog, que é http://www.gazetamaringa.com.br/blog/pospremiere/
abs!
Tom, obrigado pela visita.
Bom, acho que eu fui o único que não sentiu ódio pelo garotinho. aushuahuahuahua
Mas, realmente, para quem um dia dirigiu As Horas, Tão forte e Tão perto realmente é escorregar um pouco, mas não achei um completo desastre.
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